“Para se proteger de eventuais golpes, os inscritos no Enem podem registrar um boletim de ocorrência, afirma o professor da Direito GV Marcel Leonardi, especialista em direito na internet.
Com dados como nome, RG e CPF do aluno, criminosos podem tentar falsificar documentos, abrir uma empresa ou conta bancária.
Para Leonardi, pedidos de indenização não deverão ter sucesso, pois a Justiça costuma exigir comprovação de dano concreto - ou seja, o candidato precisaria comprovar que foi alvo de fraude, não basta demonstrar o risco.
Folha - Os alunos podem exigir indenização na Justiça?
Marcel Leonardi - Até cabe, mas não é eficaz. Em um vazamento de dados, você nunca sabe como eles serão utilizados. A Justiça tende a exigir um dano concreto.
Seria mais eficaz o Ministério Público Federal pleitear uma indenização, para forçar o governo a destinar recursos ao fundo de direitos difusos, para que sejam destinados a investimentos como educação ou tecnologia.
Para os estudantes que tiveram os dados divulgados, o que eles podem fazer?
Se eu fosse um dos alunos, faria boletim de ocorrência, chamado de preservação de direitos. Para dizer: ‘Se alguém tentar usar meus dados indevidamente, está registrado que fiz parte do grande vazamento’.
Não é um instrumento perfeito, mas uma proteção. O problema é que as delegacias não têm muita boa vontade com esse tipo de boletim”.
E o que são direitos difusos? Direitos difusos são aqueles que não conseguimos identificar e quantificar exatamente os beneficiários, mas que sabemos, com certeza, que eles existem.
Imagine uma grande queimada na floresta. São milhares de hectares queimados. A fumaça se espalha por uma região imensa. Quem teve seu direito atingido? Com certeza as populações da área queimada. Esses você consegue determinar e quantificar, ainda que seja difícil. Eles fazem parte do que chamamos de direito coletivo (quando são muitos, mas ainda assim determináveis e quantificáveis). Mas haverá mais gente afetada pela queimada. Todo mundo que respirou a fumaça espalhada pela atmosfera também será afetado, certo? Mas quem respirou a fumaça? É impossível, ou praticamente impossível, tentar determinar e quantificar essas pessoas, pois elas podem estar espalhadas por dezenas de estados, se não países, já que a fumaça se espalha de forma incontrolável. É o mesmo que ocorreu com o recente vazamento de óleo no Golfo do México: é impossível saber quem vai ser afetado, mas sabe-se que muita gente será afetada, inclusive pessoas que moram muito longe do local onde o desastre aconteceu. Ambos são casos de danos aos direitos difusos, que nada mais são do que direitos que sabemos que existem, mas não podemos determinar com precisão quem se beneficiará dele. No caso do exemplo dado pelo entrevistado, um fundo para fomento à educação é difuso porque ele pode beneficiar milhares de pessoas não só hoje, como no futuro, por isso é praticamente impossível tentar determinar quem serão seus beneficiários, o que não quer dizer que eles não existam.